Muito se tem dito, nos últimos dias, acerca da aplicabilidade da Teoria do Fato do Príncipe em razão da pandemia “Covid-19”.
Com efeito, em muitos municípios houve a edição de Decretos Municipais determinando o fechamento de estabelecimentos, visando evitar aglomerações e, por consequência, o contágio do “Corona Vírus”.
Cita-se, como exemplo, o Decreto nº 17.304 de 18 de março de 2020, do Município de Belo Horizonte/MG, que determinou a suspensão temporária de atividades em estabelecimentos como casas de shows, bares, restaurantes, academias e etc., bem como o Decreto nº 59.298, de 23/03/2020, oriundo da Prefeitura da Cidade de São Paulo, que suspendeu o atendimento presencial ao público em estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços em toda a capital paulista.
A partir daí, surgiram teorias acerca da aplicabilidade do Fato do Príncipe, na hipótese de haver extinção dos estabelecimentos empresariais, esculpido no artigo 486 da CLT e que assim estabelece:
“Art. 486 – No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável. (Redação dada pela Lei nº 1.530, de 26.12.1951)”.
Em uma leitura fria do citado artigo, diante do contexto vivenciado por todos, nos levaria à inequívoca conclusão que à espécie, a teoria seria aplicável em sentido amplo.
Todavia, recomendamos MUITA cautela acerca da utilização desta teoria pelos empregadores em suas decisões, especialmente no que pertine à dispensa de empregados.
Ressalte-se que o nosso intuito com o presente artigo não é definir se a teoria factum principis é aplicável ou não, mas sim recomendar a você, empregador, muita cautela com o referido instituto, pois ao contrário do que sugere o texto legal, a aplicação da citada teoria não deve ser feita de modo simplista.
O factum principis é ato de império da administração pública e consiste na “modalidade de força maior, representada pela inviabilização das atividades empresariais em razão de ato unilateral de autoridade municipal, estadual ou federal, ou, ainda, pela promulgação de ato normativo” ( CLT Comentada pelos Juízes do Trabalho da 4ª Região, LTr, 3ª ed., p. 387).
Extrai-se do citado artigo e da doutrina transcrita alhures, que o Fato do Príncipe consiste na impossibilidade da continuação da atividade empresarial em razão de ato de autoridade municipal, estadual ou federal, decorrente de acontecimento imprevisível e inevitável.
Aqui, tem-se o primeiro ponto em que é recomendada a cautela, onde o ato da autoridade pública tem que ser preponderante para o encerramento das atividades. Se a empresa já vinha enfrentando situações agravantes para continuidade da sua existência, resta prejudicada a aplicação do factum principis, eis que a paralisação das atividades foi uma das causas para o encerramento da atividade e não a causa efetiva do seu fechamento, perdendo espaço a relevância do ato praticado pela administração pública.
Importante esclarecer que inexiste a hipótese de dispensa do empregado e determinar que este bata à porta da Prefeitura ou outro órgão estatal exigindo o pagamento de suas verbas decorrentes da extinção contrato de trabalho.
Outro ponto que exige atenção e deve ser redobrada a cautela pelo empregador, é que a teoria do Fato do Príncipe será invocado somente em defesa em uma eventual ação trabalhista, demandando prova robusta em relação à sua ocorrência, podendo-se concluir que a dispensa amparada nesta teoria não eximirá o empregador de uma futura e muito provável demanda trabalhista.
E, mesmo sendo comprovado a ocorrência do Fato do Príncipe, o ente público ficará somente responsável pelo pagamento da multa fundiária, sendo do empregador o encargo do pagamento de demais verbas trabalhistas que o empregado venha a fazer jus.
Outro aspecto que não pode passar despercebido, são as medidas adotadas pelo Governo Federal, como por exemplo a Medida Provisória nº 927/20 e o “pacote de salários” anunciado pelo Presidente do Banco Central, que visam dar subsídios às empresas para sua manutenção, o que impossibilita ainda mais a alegação do previsto no artigo 486 da CLT seja encarada de maneira restrita.
Por fim e não menos importante, não há que se olvidar que o Fato do Príncipe, como o próprio nome remete, cuida-se de um instituto antigo e com rara aplicabilidade na seara laboral.
Entendemos o momento de crise que assola o país decorrente da pandemia do “Covid-19”, todavia, sugerimos novamente cautela aos empregadores na tomada de decisões, sob pena de sofrer ainda mais com prejuízos decorrentes de condenações trabalhistas.
O Sette Câmara, Corrêa e Bastos Advogados Associados coloca-se à disposição para quaisquer esclarecimentos sobre o tema e nas medidas a serem tomadas, de modo a dar segurança jurídica tanto para os empregados, quanto para os empregadores.
Contato: luizbastos@scbadvogados.adv.br
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