Quanto maior a crise da União, Estados e Municípios, maior é a tendência em querer arrecadar tributos com o Código Penal, ameaçando a iniciativa privada e paralisando a atividade econômica, com diminuição da arrecadação. Todos perdem. O que importa registrar aqui é a inconstitucionalidade em querer usar o direito penal para cobrar tributos.
O STF editou a Súmula vinculante nº 24, em 02 de setembro de 2009, que estabelece: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”. A finalidade é fazer cessar as ameaças de inquéritos policiais e ações penais antes mesmo do término administrativo das autuações fiscais e da consolidação exata do tributo devido. Ademais, existe uma questão lógica: sem o lançamento definitivo do tributo, não pode o Fisco cobrar e exigir na esfera cível, pois suspensa a exigibilidade do crédito, cujo valor certo ainda não existe. Se na esfera cível não é possível a cobrança, como usar o Direito Penal para alcançar a satisfação do débito? Mas não é só. A luz do bem jurídico protegido, é possível usar do Direito Penal para cobrar tributos? Eis a questão.
A contradição aumenta quando se observa que o pagamento do débito ou o seu parcelamento com pagamento inicial acarreta a extinção da punibilidade criminal ou suspensão da ação penal, isto é, o que importa é a satisfação patrimonial do débito fiscal. Ocorre que a atual Ordem Constitucional não admite prisão por dívidas, não podendo, portanto, uma inadimplência tributária ocasionar ameaça de prisão e condenação criminal, com o uso e ameaça do Direito penal, inquérito policial e seu constrangimento, para obrigar o pagamento. Pela ordem Constitucional o patrimônio do devedor é que responde pelas dívidas, não a liberdade e a dignidade do devedor, no caso, em via de regra, os sócios empresários e empreendedores, que ficam desestimulados pela humilhação da acusação penal, além das injustiças dos meios, transformando a função social da empresa em fator de criminalização, muitas vezes, quebrando a empresa. Basta ver a atual realidade.
O uso do Direito Penal para obrigar o pagamento do tributo desfigura a sua legitimidade e viola os seus preceitos, acarretando a sua execução prisão por dívidas, caracterizando, assim, inconstitucionalidade manifesta. Mais, cria um tipo penal seletivo, cujos destinatários serão os empresários, empreendedores, investidores, que movimentam a economia e geram empregos, com o enorme risco da liberdade pessoal e que merecem incentivo por parte do Estado, para o pleno desenvolvimento da Nação, não perseguição penal e humilhação policial, em detrimento da Ordem Constitucional e da Dignidade Humana, base fundante do Estado Constitucional Democrático de Direito. Há a necessidade de se estruturar todo um método defensivo Constitucional para o enfrentamento dos Crimes Contra Ordem Tributária.
RICARDO CUNHA MARTINS – ADVOGADO, ESPECIALISTA EM DIREITO PENAL, MESTRE EM DIREITO PÚBLICO E PROFESSOR DE PROCESSO PENAL.
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